Cántico Negro
*
"Ven por aquí" — me dicen algunos con ojos dulces,
Extendiéndome los brazos, y seguros
De que sería bueno si yo les oyese
Cuando me dicen: "ven por aquí!”
Yo les miro con ojos lasos,
(Hay, en mis ojos, ironías y cansancios)
Y cruzo los brazos,
Y nunca voy por ahí...
Mi gloria es esta:
¡Crear deshumanidad!
No acompañar a nadie.
— Que yo vivo con la misma desgana
Con la que rasgué el vientre a mi madre.
¡No, no voy por ahí! Sólo voy por donde
Me llevan mis propios pasos...
Si a lo que busco saber ninguno de vosotros responde,
¿Por qué me repetís: "ven por aquí"?
Prefiero resbalarme en los callejones cenagosos,
Arremolinarme a los vientos,
Como trapos, arrastrar los pies sangrientos,
A ir por ahí...
Si vine al mundo, fue
Sólo para desflorar selvas vírgenes,
¡Y dibujar mis propios pies en la arena inexplorada!
Lo demás que hago no vale nada.
¿Cómo, pues, seréis vosotros
Quienes me daréis impulsos, herramientas, y valentía
Para yo derrumbar mis obstáculos?...
Corre, por vuestras venas, sangre vieja de los abuelos,
¡Y vosotros amáis lo que es fácil!
Yo amo lo Lejano y el Espejismo,
Amo los abismos, los torrentes, los desiertos...
¡Iros! tened carreteras,
Tened jardines, tened canteros,
Tened patrias, tened techos,
Y tened reglas, y tratados, y filósofos, y sabios.
¡Yo tengo mi Locura!
La levanto, como una antorcha, ardiendo en la noche oscura,
Y siento espuma, y sangre, y cánticos en los labios...
Dios y el Diablo me guían, nadie más.
Todos tuvieron padre, todos tuvieron madre;
Pero yo, que nunca principio ni acabo,
Nací del amor que hay entre Dios y el Diablo.
¡Ah, que nadie me dé piadosas intenciones!
¡Que nadie me pida definiciones!
¡Que nadie me diga: "ven por aquí"!
Mi vida es un vendaval que se ha soltado.
Es una ola que se ha levantado.
Es un átomo de más que se ha animado...
No sé por dónde voy,
No sé a dónde voy,
— Sé que no voy por ahí.
~
Poema del Silencio
*
Sí, fue por mí que grité.
Declamé,
Tiré las frases de alrededor.
Ciego de angustia y de revuelta.
Fue en mi nombre que lo hice,
A carbón, a sangre, a tiza,
Sátiras y epigramas en las paredes
Que no vi que fueran necesarias y vosotros sí.
Fue cuando comprendí
Que nada me darían del infinito que pedí,
- ¡Que erguí más alto mi grito
Y pedí más infinito!
Yo, mi yo rico de bajas y grandezas,
Esta es la razón de las epi tragicómicas empresas
Que, sin rumbo,
Levanté con sarcasmo, sueño, humo...
Lo que buscaba
Era, como cualquiera, tener o que deseaba.
Demasiadas Fiebres, ansias de Altura y Abismo,
Tenían raíces banalísimas de egoísmo.
Que sólo porque se me vedaba
Salir de este mi ser formal y condenado,
Erigí contra los cielos mi inmenso Engaño
De intentar lo ultra-humano, ¡yo que soy tan humano!
¡Dios Señor mío en quien no creo!
Desnudo a tus pies, abro mi seno
Procuré huir de mí,
Pero sé que soy mi exclusivo fin.
Sufro, así, por lo que soy,
Sufro por este suelo que a los pies se me pegó,
Sufro por no poder huir.
Sufro por sentir placer acusándome y exhibirme!
Dios Señor mío en quien no creo, ¡porque eres mi creación!
(Dios, para mí, he llegado a la perfección...)
Señor dame el poder de estar callado,
Quieto, maniatado, iluminado.
Si los gestos y las palabras que soñé,
Nunca los usé ni usaré,
Si nada de lo que llevo a efecto vale,
¡Que yo no me mueva! ¡Que yo no hable!
¡Ah! también sé que, trabajando sólo por mí,
Era por uno de nosotros. Y así,
En este mi vano asalto a no sé qué felicidad,
Luchaba un hombre por la humanidad.
Pero mi sueño megalómano es mayor
Que el propia inmenso dolor
De comprender cómo es de egoísta
Mi máxima conquista...
¡Señor, que nunca más mis versos ávidos e impuros
Me rasguen! y mis labios se cerrarán como dos muros,
Y mi Silencio, como incienso, te alcanzará,
Y sobre mí de nuevo descenderá...
Sí, descenderá de tu mano compadecida,
¡Dios mío en quien no creo! y pondrá fin a mi vida.
Y una tierra sin flor y una piedra sin nombre
Saciarán mi hambre.
~
Testamento del Poeta
*
Todo ese esfuerzo vuestro es vano, amigos:
No soy de los que se acepta... a no ser muertos.
Demasiado, ya renuncié a cualquier puerto;
No pido vuestra limosna de mendigos.
¡Lo mismo os diré, sueños antiguos
De amor! ¡ojos en otros tiempos míos absortos!
¡Cuerpos ya hoy hinchados, viejos, tuertos,
Que fuisteis lo mejor de mis pastizales!
Y lo mismo digo a todo y a todos, - hoy
Que todo y a todos veo reducidos,
Y a mi propio Dios niego, y el aire se me escapa.
Para recuperar, sin embargo, todo el Universo,
¡Y amar! ¡Y creer! ¡Y hallar mis mil sentidos!...
Me basta el gesto de contar un verso.
***
José Régio (Vila do Conde, 1901-1969)
Versiones de Raquel Madrigal Martínez
/
Cântico Negro
*
"Vem por aqui" — dizem-me alguns com olhos doces,
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom se eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui"!
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos meus olhos, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre a minha mãe.
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde,
Por que me repetis: "vem por aqui"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas, e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Ide! tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátrias, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios.
Eu tenho a minha Loucura!
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que me guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou,
— Sei que não vou por aí.
~
Poema do Silêncio
*
Sim, foi por mim que gritei.
Declamei,
Atirei frases em volta.
Cego de angústia e de revolta.
Foi em meu nome que fiz,
A carvão, a sangue, a giz,
Sátiras e epigramas nas paredes
Que não vi serem necessárias e vós vedes.
Foi quando compreendi
Que nada me dariam do infinito que pedi,
- Que ergui mais alto o meu grito
E pedi mais infinito!
Eu, o meu eu rico de baixas e grandezas,
Eis a razão das épi trági-cómicas empresas
Que, sem rumo,
Levantei com sarcasmo, sonho, fumo...
O que buscava
Era, como qualquer, ter o que desejava.
Febres de Mais, ânsias de Altura e Abismo,
Tinham raízes banalíssimas de egoísmo.
Que só por me ser vedado
Sair deste meu ser formal e condenado,
Erigi contra os céus o meu imenso Engano
De tentar o ultra-humano, eu que sou tão humano!
Senhor meu Deus em que não creio!
Nu a teus pés, abro o meu seio
Procurei fugir de mim,
Mas sei que sou meu exclusivo fim.
Sofro, assim, pelo que sou,
Sofro por este chão que aos pés se me pegou,
Sofro por não poder fugir.
Sofro por ter prazer em me acusar e me exibir!
Senhor meu Deus em que não creio, porque és minha criação!
(Deus, para mim, sou eu chegado à perfeição...)
Senhor dá-me o poder de estar calado,
Quieto, maniatado, iluminado.
Se os gestos e as palavras que sonhei,
Nunca os usei nem usarei,
Se nada do que levo a efeito vale,
Que eu me não mova! que eu não fale!
Ah! também sei que, trabalhando só por mim,
Era por um de nós. E assim,
Neste meu vão assalto a nem sei que felicidade,
Lutava um homem pela humanidade.
Mas o meu sonho megalómano é maior
Do que a própria imensa dor
De compreender como é egoísta
A minha máxima conquista...
Senhor! que nunca mais meus versos ávidos e impuros
Me rasguem! e meus lábios cerrarão como dois muros,
E o meu Silêncio, como incenso, atingir-te-á,
E sobre mim de novo descerá...
Sim, descerá da tua mão compadecida,
Meu Deus em que não creio! e porá fim à minha vida.
E uma terra sem flor e uma pedra sem nome
Saciarão a minha fome.
Testamento do Poeta
*
Todo esse vosso esforço é vão, amigos:
Não sou dos que se aceita... a não ser mortos.
Demais, já desisti de quaisquer portos;
Não peço a vossa esmola de mendigos.
O mesmo vos direi, sonhos antigos
De amor! olhos nos meus outrora absortos!
Corpos já hoje inchados, velhos, tortos,
Que fostes o melhor dos meus pascigos!
E o mesmo digo a tudo e a todos, - hoje
Que tudo e todos vejo reduzidos,
E ao meu próprio Deus nego, e o ar me foge.
Para reaver, porém, todo o Universo,
E amar! e crer! e achar meus mil sentidos!....
Basta-me o gesto de contar um verso.
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